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Polícia

MPT condena concessionária ferroviária a cumprir 35 obrigações

Ação constatou jornadas exaustivas, condições laborais degradantes e desrespeito aos empregados

Sexta-feira, 10 Outubro de 2025 - 18:50 | Issel Chaia


MPT condena concessionária ferroviária a cumprir 35 obrigações
Decisão atende pedidos do MPT-MS e impõe 35 obrigações à concessionária ferroviária, após constatação de jornadas exaustivas, condições laborais degradantes e desrespeito à dignidade dos empregados (Foto: Divulgação/MPT-MS)

A empresa Rumo Malha Oeste S.A., do grupo Rumo Logística, foi condenada pela 3ª Vara do Trabalho de Campo Grande a cumprir 35 obrigações após inobservância de diversas normas trabalhistas.

A sentença parte de pedidos formulados pelo Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso do Sul (MPT-MS), e atende ação movida depois da confirmação de condições de trabalho degradantes, jornadas excessivas, desrespeito às normas ambientais de saúde e segurança do trabalho, ausência de intervalo para repouso, alimentação e satisfação de necessidades fisiológicas, além da violação aos direitos da personalidade e depreciação da dignidade dos trabalhadores da Rumo Malha Oeste.

Durante vistorias realizadas entre 2016 e 2017, as irregularidades foram classificadas com Grau de Risco 3 foram reafirmadas conforme apontado em laudos específicos elaborados pelos peritos em Engenharia de Segurança do Trabalho do MPT-MS.

Centenas de autuações pelo Ministério do Trabalho e Emprego contra o grupo econômico Rumo Logística estão pendentes, conforme enfatizado pela então procuradora do Trabalho, na ação civil pública ajuizada pelo MPT-MS, em 2014, Simone Beatriz Assis de Rezende, como investigações e procedimentos administrativos conduzidos pelo MPT, reclamatórias trabalhistas propostas por trabalhadores e pela entidade sindical, além de decisões judiciais em primeira e segunda instâncias.

No período do ajuizamento da ação, sete procedimentos investigatórios em face das empresas daquele grupo econômico, tramitavam no MPT-MS com retrato de várias irregularidades trabalhistas envolvendo controle de ponto, duração da jornada de trabalho, intervalos interjornadas e condições estruturais dos alojamentos.

Na presença de representante sindical da categoria profissional, o depoimento de um maquinista prestador de serviços na cidade de Corumbá relatou que, apesar de constar oito horas em sua jornada diária, trabalhava sempre de 12 a 15 horas por dia. Ainda, narrou que não realizava intervalo para refeição nem descanso, tendo que se alimentar dentro do trem em movimento. Também alegou que, maquinistas e auxiliares da Rumo Malha Oeste tinham que realizar suas necessidades fisiológicas em área de mata.

Outro maquinista de Corumbá relatou que a concessionária passou a disseminar a ideia de que "é melhor andar só que mal acompanhado", levando a aceitação por parte dos empregados, do sistema de monocondução, onde há um único trabalhador em cada locomotiva. Ainda, não tinha permissão para que eles utilizassem as instalações sanitárias do "pernoite", por as suas roupas e calçados ficam muito sujos devido ao minério de ferro transportado".

A terceira testemunha ouvida pelo MPT-MS alega que, por não poder parar o trem, tinha que segurar as necessidades fisiológicas por até oito horas. Para urinar, utilizava a janela da locomotiva, enquanto apertava o dispositivo "homem morto" com o pé.

No decorrer da ação, a procuradora traçou o contexto histórico de um grave acidente envolvendo duas composições da Rumo Malha Oeste, que utilizava o sistema de monocondução e bateram de frente. O caso aconteceu em agosto de 2012, por volta das 4h30, perto do pátio ferroviário em Morangas, Chapadão do Sul.

Em análise aos autos, o juiz Marco Antonio de Freitas destacou que a sentença alcança os empregados da empresa Rumo Malha Oeste que trabalham ao longo da malha férrea entre os estados de Mato Grosso do Sul e São Paulo, em trechos que passam por Corumbá a Mairinque.

Embora outras três empresas do grupo Rumo Logística - que também integram o polo passivo do processo - não se sujeitem à jurisdição da 3ª Vara do Trabalho de Campo Grande, podem vir a ser responsabilizadas pelos danos causados pela Rumo Malha Oeste, por compor o conglomerado econômico.

Apesar do trecho da concessão da Rumo Malha Oeste se estenda para além da região geográfica de jurisdição da 3ª Vara do Trabalho de Campo Grande, a decisão considerou que a competência se mede pela extensão da área atingida pelos danos decorrentes da exploração direta do transporte ferroviário. Comprovada a concorrência da jurisdição de mais de uma Vara do Trabalho, neste caso, sendo da 3ª Vara do Trabalho de Campo Grande, onde a ação foi distribuída inicialmente.

Foi constatado, em relação às condições das locomotivas e alojamentos, ao longo dos mais de 10 anos de tramitação do processo movido pelo MPT-MS, a inexistência de banheiro nas locomotivas. Em vistorias realizadas em algumas das locomotivas e composições férreas em uso pela Rumo, durante perícia judicial, foi concluído que nenhuma daquelas utilizadas no trecho Corumbá-Porto Esperança possuía banheiro. Ainda, os autos de linha que transitam ao longo de todo o tronco Bauru/SP-Corumbá/MS também não tinham banheiro.

Consta em relatórios gerados com as inspeções dos peritos do MPT-MS e de laudo produzido pela perícia judicial que, por exemplo, no alojamento da empresa localizado em Chapadão do Sul o trajeto entre o local de embarque na locomotiva e o estabelecimento era escuro, se iluminação, sujo, com mato alto, com passagem entre dormentes, buracos e trilhos jogados. Também provou que a Rumo Malha Oeste possuía máquinas em que o sistema de transmissão de força estava desprotegido, o que poderia lesionar em caso de contato pelo trabalhador.

Inspeções verificaram, durante a ação do MPT-MS, a inadequação dos assentos dos postos de trabalho, incluindo os assentos das locomotivas e demais composições ferroviárias, que não eram adaptados às normas de ergonomia.

As multas, conforme sentença, em caso de descumprimento das obrigações de fazer e de não fazer, podem chegar a 100 mil reais por mês. O prazo de 90 dias para que a empresa implemente as obrigações fixadas na decisão, foi determinado pela Justiça, a contar da sua intimação após o trânsito em julgado.

A empresa Rumo Malha Oeste S.A. foi condenada a pagar indenização por danos morais coletivos no valor de 12 milhões de reais, cuja destinação será definida na fase de execução da sentença. O juiz considerou elementos objetivos, para fixar esse montante, como a situação do grupo econômico integrado pela ré, com capital social superior a 8 bilhões de reais; o conhecimento da ré em relação a existência das condições de ilegalidade constatadas ao longo dos anos e a recusa pela assinatura de acordo extrajudicial proposto pelo MPT-MS desde as primeiras inspeções.

A empresa Rumo Malha Oeste S.A. também foi condenada pela 3ª Vara do Trabalho de Campo Grande, em novembro de 2023, ao cumprimento de obrigações laborais e ao pagamento de indenização por danos morais coletivos no valor de 2 milhões de reais. As determinações impostas pela sentença são: concessão regular dos intervalos intrajornada e interjornada; registro correto dos horários de trabalho e descanso; observância integral das normas de segurança na operação e manutenção de máquinas; realização de exames médicos periódicos para trabalhadores expostos a riscos, e respeito aos limites legais de jornada e de prorrogação de trabalho. O processo, atualmente, tramita no Tribunal Superior do Trabalho. 

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