Geral
Na pecuária ou agricultura, sustentabilidade é cotidiano de produtores sul-mato-grossenses
Pecuária orgânica é crescente no Pantanal, enquanto a Capital investe em hortas sem agrotóxicos
Sexta-feira, 20 Maio de 2022 - 11:00 | victoria oliveira

O conceito de investir em uma produção de carne sustentável à saúde humana e ambiental está na rotina de um grupo de pecuaristas do Pantanal sul-mato-grossense há pelo menos dez anos. O intuito é utilizar terras nativas e preservar o solo de intervenções agrícolas a médio e longo prazo. Ainda modesto no Estado, o mercado promete crescer e conquistar cada vez mais consumidores do sistema orgânico pantaneiro.
O Programa Carne Sustentável do Pantanal foi criado em 2011, pela Associação Pantaneira de Pecuária Orgânica e Sustentável (ABPO), fundada por pecuaristas pantaneiros que preocupam-se com a questão ambiental, com objetivo de qualificar e certificar as propriedades do Pantanal que seguem critérios socioambientais e boas práticas produtivas. O gerente-executivo da ABPO, Silvio Balduíno explica detalhes dessa produção.

“A pecuária sustentável tem evoluído bastante, se tornado muito mais acessível aos pecuaristas pantaneiros”, relata. O gerente-executivo esclarece, ainda, que a necessidade de evolução motivou a criação da ABPO. "A legislação de produção orgânica ainda não é capaz de evoluir na mesma velocidade que a tecnologia, então, achamos [produtores da área] necessário desenvolver o nosso próprio protocolo, que fosse capaz de acompanhar nossos ideais", afirmou Balduíno.
Além da padronização, o programa busca o desenvolvimento de um modelo de cadeia de valor da carne bovina sustentável, que contribua para a disseminação do conhecimento deste tipo de produção em Mato Grosso do Sul.
Para o pecuarista, a sustentabilidade tem andado cada vez mais em conjunto com a pecuária. Atualmente, são sete propriedades que possuem certificação de pecuária orgânica, com 15 produtores e um rebanho de 80 mil animais distribuídos em 100 mil hectares de terras pantaneiras.
Conforme o levantamento divulgado na última terça-feira (17), pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Pantanal e Embrapa Gado de Corte, também estadual, em parceria com a ABPO, o desenvolvimento da cadeia produtiva de bovinos criados em sistema orgânico, em Mato Grosso do Sul, apresentou crescimento exponencial entre o período de junho de 2020 e maio de 2021.

Ainda, de acordo com a associação, o número de fazendas certificadas no Pantanal dobrou de 2021 para 2022. Até o ano passado, 30 propriedades integravam a ABPO, enquanto, neste ano, os locais passaram para 60. “Temos fazendas em todas as regiões pantaneiras certificadas em produção de carne orgânica e sustentável”, ressalta Balduíno.
Para o local adquirir o selo de produção sustentável é necessário seguir alguns critérios, reforça o pecuarista. Conforme o representante da ABPO, controle de lotação de pastagens, de modo a evitar compactação, perda de nutrientes e desequilíbrio do solo, além de proteção dos recursos hídricos e recuperação de áreas degradadas e utilização de pastagens do Pantanal estão entre os critérios exigidos para a criação se enquadrar neste sistema.
Outro ponto importante a ser ressaltado é referente à certificação. A Lei nº 10.831/03, ou “Lei dos Orgânicos”, regulamentada em 27 de dezembro de 2007 pelo Decreto nº 6323, prevê o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) como órgão regulador dos certificados.

Porém, a ABPO visa expansão maior. Desde 2008, a associação tem pleiteado com o Governo do Estado de Mato Grosso do Sul recursos para ampliar ainda mais os negócios, especialmente pelo alto custo vinculado à alimentação dos bovinos. Na produção orgânica, grãos transgênicos, isto é, aqueles que possuem DNA modificado pela inserção de um ou mais genes de outro organismo, não são utilizados, o que faz com que os produtores passem a cultivar o alimento do gado, explica o gerente-executivo.
Cenário da agropecuária em MS
A produção sustentável de carnes, um dos ramos da agropecuária em Mato Grosso do Sul, é considerada uma das atividades econômicas mais fortes do Estado. Conforme dados do Governo Estadual, o agronegócio representa 37% do Produto Interno Bruto (PIB) do território sul-mato-grossense, com 14 cidades entre os 100 municípios mais ricos deste segmento no Brasil, como indica o levantamento do Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
O agronegócio, ainda, não fica para trás quando o assunto é geração de emprego, e teve avanço significativo na criação de vagas, com 3.889 possibilidades abertas e preenchidas em 2021 e outras 4.046 em 2022.
O cenário forte desse segmento no Estado é auxiliado por investimentos, como o programa “Campo Mais Seguro - Policiamento Rural”, oferecido pelo Governo do Estado e pela Polícia Militar para gerar mais segurança aos proprietários e inibir roubos e furtos em propriedades rurais. A ação para assegurar a atividade econômica e dar continuidade ao serviço de Segurança Pública foi tão forte que contou, ainda, com assistência do Sindicato Rural de Campo Grande (SRCG) para atrair e cadastrar os agropecuaristas das propriedades rurais na iniciativa.

O Sindicato, ainda, trabalha na convocação de trabalhadores da classe para compartilharem suas demandas no Interagro 2022, de modo a serem entregues aos candidatos ao Governo do Estado das eleições deste ano. A segunda edição deste evento, que será realizada entre os dias 8 e 11 de junho, também reunirá palestrantes para debater temas relevantes para o setor, além de nomes importantes no cenário do agronegócio.
Fora dos campos
A capital sul-mato-grossense também é beneficiada pela sustentabilidade: hortas sem o uso de agrotóxicos. Mais saudáveis para saúde humana e ambiental, além de mais apetitosos, como descreve o proprietário da Horta Biosaúde Produtos Agroecológicos, Hélio Alves Farias Júnior, de 26 anos, os alimentos produzidos nos estabelecimentos abastecem as residências locais e geram empregos para os campo-grandenses e migrantes de outros estados.
“Aqui nós temos os funcionários fixos, que cuidam do atendimento e da manutenção da plantação, e algumas pessoas que buscam serviços ocasionais e ficam, geralmente, um dia, uma semana”, explica o proprietário do local. A horta localizada na Rua Afrânio Peixoto, no Bairro Santo Antônio, possui uma organização mais “caseira”, sem muita delimitação de espaço entre os alimentos plantados. “A gente diz também que é agroflorestal, por ter árvores frutíferas espalhadas entre as plantações no solo”, justifica Hélio.

O agricultor conta, também, que a horta ganhou o status de empresa com o tempo. Inicialmente, começou como uma plantação no fundo do quintal de um dos funcionários, Abel. Hélio conta que, com o tempo, o espaço ficou pequeno, e o homem teve a ideia de expandir a plantação.
“Ele foi encontrando terrenos aqui pelo bairro para fazer a horta. As pessoas gostaram, porque ele quem limpou os locais de todo mato existente, que era bem perigoso, com casos de pessoas se escondendo entre as vegetações. Então, foi expandindo e ele foi contratando mais pessoas”, contou. Atualmente, Hélio é o responsável legal pela empresa, mas garante que a posição de Abel ainda é a mais alta. “Ele é o chefe”, brinca.

Empreendedorismo - Um dos pontos mais notórios na Biosaúde é a capacidade de empreendedorismo do local. Com início caseiro, há seis anos, a chegada de clientes, funcionários e diaristas agregou ao local a posição de microempresa (ME) e Hélio conta, ainda, que possui até CNPJ. "Com o tempo o Abel viu que a coisa foi ficando séria. Ele não estava mais sozinho, ele auxiliava economicamente famílias com a horta", relembra Hélio Alves.
Ao todo, a Biosaúde atende cerca de mil compras mensais, entre pessoas que vão e voltam. "Ninguém que é nosso cliente compra aqui só uma vez", relata o agricultor. A capacidade empreendedora foi presente, também, na Horta do Japonês, na Rua Domingos Jorge Velho, no Bairro Vilas Boas. Funcionário do local, Jefferson Barbosa Baptista, de 36 anos, afirma que o estabelecimento fornece, pelo menos, 300 compras por dia.

O local conta com funcionários agregados, mas a Horta do Japonês, que, inclusive, foi nomeada por uma cliente local, é uma empresa iniciada há 30 anos por uma família japonesa que mora próxima ao local.
Produções diferentes - Apesar de terem a mesma função, suprir a necessidade dos residentes locais, as hortas do Japonês e Biosaúde possuem processos produtivos diferentes. No caso da horta no Bairro Santo Antônio, a produção é agroecológica. “É mais ou menos a produção orgânica, livre de agrotóxicos e adubos químicos, mas nós ainda não temos o selo”, conta Hélio. A certificação em questão é um reconhecimento do Mapa e indicado na embalagem dos produtos. Nesta técnica, o uso de químicos não é presente.
Na Biosaúde, os alimentos crescem com auxílio do adubo produzido no terreno por meio de compostagem. “Não é uma compostagem profissional, que vai fazer todo aquele trabalho com a matéria orgânica. A gente simplesmente armazena em local aberto as folhas, que chegam verdes, e deixamos secar. Aí elas recebem sol, chuva e vão se decompondo naturalmente. Só então jogamos nos terrenos para melhor composição do solo”, explica Hélio.

No caso da Horta do Japonês, a produção é chamada de natural. "O orgânico tem todo um processo de limpeza de terra, que passa por mais ou menos uns dois anos. Aqui é natural, porque a gente trata a terra, mas não tem nenhum agrotóxico na folha", justifica. O atendente explica que o tratamento é realizado por meio da correção de calcário, acidez e "por aí vai".
As hortaliças são plantadas e passam por processo de germinação natural, para, depois, serem colhidas e entregues ao consumidor. No caso de verduras e legumes, o fornecimento é da Central de Abastecimento de Mato Grosso do Sul (Ceasa). Jefferson Barbosa conta, também, que a Horta do Japonês passou pelo processo para se tornar orgânica, porém, "não deu certo" para a produção deles.
Problemas urbanos - Por ser no meio de um bairro, a Horta do Japonês registra um problema recorrente do cotidiano de Campo Grande: invasões e furtos, especialmente das hortaliças plantadas, fios e, inclusive, equipamentos utilizados na horta. Paulo Roberto, de 32 anos, que trabalha há cerca de um ano na manutenção e plantação do local, encontrou uma solução inusitada para driblar essa situação: colocar uma placa de trânsito na entrada do estabelecimento.
“Tinha um homem entrando aqui, a nossa câmera de segurança pegou a imagem dele. Ele vinha de madrugada e levava alface e fios, até quebrou uns pés de couve que nós temos. Aí eu vi essa placa de pare jogada no mato que tem lá no fundo do terreno e coloquei aqui. O engraçado foi que ele parou, não veio mais”, conta. “Acho que funcionou”, comemora Paulo.

Saúde - Hélio conta que o estilo de vida saudável é o que mais atrai os consumidores da Biosaúde. “Nós [funcionários] seguimos um estilo de vida saudável, sempre gostamos disso. A nossa horta é muito procurada pelos moradores do bairro. Não tem agrotóxico, então, não tem danos para a saúde”, conta.
Tanto na Horta do Japonês quanto na Biosaúde, o atendimento é preferencial para residentes dos bairros, porém a horta agroecológica esporadicamente abastece uma escola municipal localizada no Bairro Santo Antônio.
O proprietário relata, também, que os alimentos agroecológicos possuem maior durabilidade. “Muita gente fala que nossas frutas, verduras e legumes são mais frescas e duram mais na geladeira. Uma vez um cliente meu contou que viajou por uns 20 dias para o Nordeste e deixou um pimentão na geladeira. Quando ele voltou, ainda estava ‘fresquinho’. Deu para chegar e fazer o almoço”.
Outro ponto é a busca pela saúde ambiental, uma vez que ambos os processos trabalham para fortalecer o solo, seja com intervenção de adubos naturais seja com conhecimentos avançados da ciência, e melhora da composição da água, sem a intervenção de químicos tóxicos para o meio ambiente.
Saiba mais
A nível governamental, o Plano Estadual de Agroecologia, Produção Orgânica e Extrativismo Sustentável Orgânico auxilia produtores de todo Mato Grosso do Sul no intuito de fomentar a produção agroecológica, orgânica e extrativista sustentável, além de fortalecer e estimular a organização de grupos de produtores, ampliar canais e redes de comercialização, bem como geração e socialização do conhecimento agroecológico.
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