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“Ver quem você ama nesse estado é como tomar veneno em conta-gotas”, diz filho após 2 anos do acidente dos pais

Dificuldades após a tragédia vão além da questão física e financeira, danos emocionais também afetam quem sobrevive

Quinta-feira, 22 Maio de 2025 - 07:25 | Emanuely Lobo


“Ver quem você ama nesse estado é como tomar veneno em conta-gotas”, diz filho após 2 anos do acidente dos pais
Datas comemorativas que eram comemoradas em família hoje são lembradas com saudade (Foto: Divulgação/Redes Sociais)

O que parecia apenas mais uma manhã comum para o casal Eliana Aparecida Borges Costa e Jair Vieira da Costa, ambos com 55 anos, transformou-se em um marco trágico na história da família. No dia 7 de julho de 2022, os dois foram vítimas de um grave acidente de trânsito na Avenida Duque de Caxias, em Campo Grande (MS), que até hoje reverbera na rotina da família.

Na manhã de 7 de julho de 2022, Jair e Eliana seguiam em uma motocicleta modelo Yamaha XTZ Crosser quando foram atingidos por uma caminhonete. Com o impacto da batida, Jair foi arremessado a cerca de 20 metros e Eliana a aproximadamente 50 metros de distância.

Segundo o filho do casal, Gabriel Jair Borges da Costa, de 22 anos, seu pai sofreu múltiplos ferimentos graves, entre eles uma fratura exposta na perna esquerda e ruptura do baço. Jair passou por uma cirurgia de emergência ainda no dia do acidente, que resultou na amputação da perna esquerda. “Nunca vou me esquecer da forma como o vi, tanto antes quanto depois da cirurgia”, contou o jovem. Jair recebeu em abril de 2025 uma prótese que lhe permitiu voltar a andar com auxílio.

 

O quadro de saúde de Eliana, que estava na garupa da motocicleta, foi ainda mais delicado. Ela sofreu politraumatismo craniano, fraturas em ambos os braços e uma fratura exposta na perna. A colisão também causou uma fratura na costela, que comprometeu um dos pulmões, além de uma severa perda de sangue. Após passar meses hospitalizada, Eliana recebeu alta, mas precisou ser internada novamente após uma intercorrência médica. Desde então, permanece em casa em estado vegetativo, fazendo sua alimentação por sonda. 

Acidente muda vida de família para sempre
Eliana segue em estado vegetativo desde a alta do hospital em 2023 (Foto: Divulgação/ redes Sociais) 

 

A volta para casa, após meses de hospitalização, foi mais um dos inúmeros desafios enfrentados pela família, a residência onde o casal morava antes do acidente já não oferecia estrutura suficiente para atender às novas necessidades, diante disso, o filho do casal mobilizou familiares para encontrar um imóvel mais adequado. “Eu já morava sozinho, mas minha casa fica em um condomínio pequeno e não tinha como adaptá-la. Então, tomamos a decisão de alugar um espaço maior, que atendesse às necessidades deles”, explica Gabriel. A mudança para a nova casa aconteceu em janeiro de 2023, logo após Eliana receber alta hospitalar.

A nova fase exigiu grandes adaptações. Além do impacto emocional, vieram os desafios financeiros. Gabriel que no ano do acidente cursava fisioterapia em uma instituição particular, conta que, embora a alimentação especial de Eliana hoje seja fornecida gratuitamente por meio de uma liminar judicial, a autorização demorou para sair. Enquanto isso, a família precisou contar com doações para garanti-la. “Após a alta da minha mãe, a dificuldade bateu à nossa porta. Passamos a depender de doações para que não faltasse a alimentação dela. Tive que trancar minha faculdade, porque além de não sobrar tempo para estudar, a situação financeira também apertou muito”, relata o jovem. 

O filho do casal lembra com saudade da rotina da família antes da tragédia. Apesar de já viverem em casas separadas, os encontros noturnos eram marcados por alegria e muitas risadas. “Lembro que na noite anterior ao acidente, meu pai me deixou em casa dizendo: ‘Amanhã, 7h, estou aqui pra te buscar e te levar pro trabalho. O pai te ama’. Mas no outro dia, o cenário mudou completamente.”, contou. 

As datas comemorativas também deixaram de ter o mesmo significado. Os momentos antes comemorados em família, hoje são acompanhados de saudade. “Meu primeiro aniversário depois do acidente foi no hospital com ela. No primeiro aniversário do meu pai, ele ainda estava sedado, sem saber que havia perdido a perna. E o primeiro aniversário da minha mãe também foi no hospital. O Dia das Mães continua sendo uma data muito difícil. Nunca mais nada teve graça”, diz.

Acidente muda vida de família para sempre
Gabriel relembra momentos com a mãe (foto: divulgação/ redes Sociais) 

Gabriel fala sobre a relação com a mãe e o vazio deixado pela sua ausência, mesmo estando fisicamente presente. Desde o acidente, ele faz uso de medicamentos e realiza acompanhamento psicológico devido a crises de ansiedade. “Os espaços vazios deixados pela ausência da minha mãe desde aquele dia são preenchidos hoje com toda a saudade que sinto. A dor de ver quem você mais ama nesse estado é como tomar veneno em um conta-gotas.”

Quase três anos após o acidente, a família ainda espera a conclusão do processo judicial que investiga as circunstâncias e responsabilidades da colisão. Enquanto isso, a recuperação física e emocional de Jair e Eliana segue com apoio médico e familiar. 

Número de vítimas do trânsito 

Na última semana, a Santa Casa de Campo Grande divulgou os números referentes a atendimentos hospitalares de pacientes envolvidos em sinistros de trânsito. Ao todo, 8.803 vítimas deram entrada no pronto-socorro do hospital, de janeiro a abril deste ano. As colisões envolvendo motos e carros totalizaram 393 ocorrências, enquanto os acidentes entre duas motocicletas somaram 79 casos.

O Batalhão de Policiamento de Trânsito (BPTran) divulgou também uma parcial do número de sinistros de trânsito na capital. O relatório mostra também que, de 01 de janeiro a 07 de maio de 2025, foram registrados 4.280 acidentes, desses 1.492 com vítimas.

Nesta semana, três pessoas perderam a vida em decorrência de acidentes de trânsito: Vilson Stefanelli, de 50 anos, e Evanir Fátima Antunes, que morreram após colisão frontal em um caminhão na rodovia BR-262, entre Indubrasil e Terenos, nesta terça-feira (20) e Matheus Leandro Silva, de 28 anos, que morreu na manhã desta segunda-feira (19) após bater em um poste na Avenida Duque de Caxias, no Bairro Santo Antônio. O acidente de Matheus foi a poucos metros de onde, em 2022, Jair e Eliana se acidentaram.

Dificuldades após a tragédia vão além da questão física e financeira, danos emocionais também afetam quem fica 

 

 

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