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Cultura

Escritora faz análise crítica de poema que celebra os 43 anos de MS

Poeta Rubenio Marcelo fez poema para celebrar o aniversário de criação de MS com publicação exclusiva no Diário Digital

Domingo, 18 Outubro de 2020 - 07:00 | Redação


Escritora faz análise crítica de poema que celebra os 43 anos de MS
(Foto: Raquel de Souza-Divulgação)

A professora, poeta e ensaísta Ana Maria Bernardelli fez uma análise crítica do poema Ave, MS!… 43 anos que homenageia o aniversário de criação de Mato Grosso do Sul celebrado em 11 de Outubro. De autoria do poeta Rubenio Marcelo, o poema foi escrito para publicação exclusiva no Diário Digital. Veja aqui.

Conforme Ana Maria Bernardelli, “o poema de Rubenio Marcelo conquista o leitor de imediato tanto pelo cuidado no uso adequado de um léxico que contempla a riqueza da linguagem quanto pela sinestesia e a intensa força dos substantivos que se transmutam em verdadeiros adjetivos.”

O poema foi publicado em 11 de Outubro em destaque junto com as matérias sobre o aniversário de MS. O ‘Ave, MS!… 43 anos’ é um banquete poético completo que evoca a imagem natural, história e diversidade do Estado. Há espaço ainda para um tributo a duas obras literárias representativas de MS Inocência, de Visconde de Taunay, e Camalotes e Guavirais, de Ulysses Serra.

Além do ‘Ave, MS!… 43 anos’, Rubenio fez ainda, para publicação exclusiva no DD, um segundo poema que fala sobre queimadas no Pantanal, o 'Elegia ao Pantanal'. Neste, em frases dramáticas que denunciam o sofrimento da flora e fauna, o poeta traz um grito contra a degradação do santuário natural.

Leia abaixo:

Ave, MS!… 43 anos

movimentos, prélios e conquistas

singram o coração da história

destes horizontes, seivas e paisagens…

e quantos sonhos plurais,

caminhos e descobertas

em aliados destinos sedentos de auroras

pulsam nestes altiplanos e planícies além-limites…

de ressurgentes sinas e sinais,

a natureza, o concreto, ritmo e sentidos

destas palavras de terra e de vida…

a face das evocações grafadas na alma,

a placenta dos gorjeios da linguagem,

o abrigo dos rizomas

destes versos-estatutos da existência…

os equilíbrios dos pontos cardeais

dos tratados das pedras e das águas

entre trilhos azuis e edificações,

– o essencial e o estético –

vêm destes serrados… dos pastores…

dos galpões e estâncias… sagas ervateiras,

de montes e sertões confidentes,

de guia retirada em estratégia,

das altivas etnias e resistências,

das imigrações… jazidas e pantanais…

das lúcidas utopias… da miscigenação…

destas searas de en/cantos de Taunay

[chão de Inocência]

e de Ulysses, serras, rios, ‘camalotes e guavirais’…

ah, estrela dourada de nova constelação,

geografia natural dos ancestrais da essência

de gerações, têmperas, identidades e seres

coesos em diversidade,

pertencimento e cidadania

na esfera indivisa e no ventre

desta jovem pátria-lugar:

Mato Grosso do Sul!

Ana Maria Bernardelli autorizou a publicação da análise crítica pelo Diário Digital. O texto segue abaixo na íntegra.

Inúmeros são os posicionamentos quanto às funções da crítica literária e destaco aqui aquele que mais direciona o meu fazer nesta área – o trabalho crítico de circunscrever o texto em tempo e espaço específicos e ainda considerá-lo como resposta a uma proposição. Pois bem, em relação a esta crítica, tal proposição se reveste de um convite singular do Diário Digital feito ao poeta Rubenio Marcelo para celebrar em versos a data de 11 de outubro, quando Mato Grosso do Sul comemora 43 anos de criação.

Nascido à beira dos verdes mares nordestinos, com o típico coração de sertanejo forte e combativo, Rubenio Marcelo é hoje um ícone na literatura do MS, estado que ele abraçou como seu segundo lar e no qual produziu sua vasta obra de indiscutível valor literário. Feliz escolha do Diário Digital, pois Rubenio Marcelo é um dos nossos mais representativos poetas, seja pela exuberância da sua linguagem, seja pela vividez das cores poéticas e expressividade encantatória e comovente. Com essa caminhada literária invejável, nada mais natural o título de cidadão sul-mato-grossense, o qual RM carrega com orgulho e carinho desmedido.

Dou-me o direito de escrever somente sobre o que merece atenção e Rubenio Marcelo é um desses poetas que sempre me surpreendem a cada poema publicado. Não há reincidências nem recuos, ao contrário, sua obra aprofunda e progride tanto em conteúdos quanto em aspectos formais. Cada poema é um momento impactante e que leva à reflexão e ao embevecimento.

Ao ler o poema Ave, MS!...43 anos, os versos fluem, permeados pelas metáforas, marca do poeta, e a atividade de busca de sentidos torna-se tarefa prazerosa, principalmente, quando o autor pontua conceitos da história, aspectos da sociedade sul-mato-grossense e da exuberante natureza.

O crítico Harold Bloom em Cânone Americano cita Samuel Johnson, seu crítico preferido, do qual aprendeu que “é preciso dar valor à biografia mais do que à história”.

O poema Ave, Ms!... transpira o conhecimento e as vivências de RM  no “labirinto vivo da literatura rubeniana. ”

          “ movimentos, prélios e conquistas

           singram o coração da história

           destes horizontes, seivas e paisagens…

           e quantos sonhos plurais,

           caminhos e descobertas

           em aliados destinos sedentos de auroras

           pulsam nestes altiplanos e planícies além-limites…”

       Não me furto de exultar o que há de sublime e etéreo nesses versos iniciais. RM sabe, com maestria, descrever sem dar a solução! Supre as carências imaginativas do leitor, convidando-o a ver “as modalidades do visível”!

           RM continua seu poema e canta o que ouve e vê – natureza, concreto...- mas  com comovente e impressionantes declarações poéticas sem comparações e altamente peculiares ao seu estilo, uma transcendência de estética inabitual.

         “ de ressurgentes sinas e sinais,

          a natureza, o concreto, ritmo e sentidos

          destas palavras de terra e de vida…

          a face das evocações grafadas na alma,

          a placenta dos gorjeios da linguagem,

          o abrigo dos rizomas

          destes versos-estatutos da existência…”

       O poema de Rubenio Marcelo conquista o leitor de imediato tanto pelo cuidado no uso adequado de um léxico que contempla a riqueza da linguagem quanto pela sinestesia e a intensa força dos substantivos que se transmutam em verdadeiros adjetivos.

       A penúltima estrofe se configura por uma profusão de informações que culminam na descrição do que foi a exuberante história desse estado laborioso e dos traços da forte personalidade sul-mato-grossense.

“os equilíbrios dos pontos cardeais

dos tratados das pedras e das águas

entre trilhos azuis e edificações,

– o essencial e o estético –

vêm destes serrados… dos pastores…

dos galpões e estâncias… sagas ervateiras,

de montes e sertões confidentes,

de guia retirada em estratégia,

das altivas etnias e resistências,

das imigrações… jazidas e pantanais…

das lúcidas utopias… da miscigenação…

destas searas de en/cantos de Taunay

[chão de Inocência]

e de Ulysses, serras, rios, ‘camalotes e guavirais’…”

       Os serrados, as sagas ervateiras, os sertões confidentes, as altivas etnias, as imigrações, as utopias, os en/cantos de Taunay e os camalotes e guavirais são  protagonistas  desta aventura sonhada e tornada realidade . Toda essa poesia de existência, superação e concretização sintetiza o poeta no auge do controle artístico. Atingiu aqui o poeta o clímax poético do poema.

       Eis a estrofe final. Uma saudação de amor incondicional à “pátria-lugar”. Mais uma vez o uso das metáforas e de palavras comuns às quais o poeta confere um peso especial, inusitado.

“ah, estrela dourada de nova constelação,

 geografia natural dos ancestrais da essência

de gerações, têmperas, identidades e seres

coesos em diversidade,

pertencimento e cidadania

na esfera indivisa e no ventre

desta jovem pátria-lugar:

Mato Grosso do Sul!”

O poema reforça a história passada e o presente singular da terra morena.

Rubenio Marcelo é um poeta abrangente; não admite reduções simplistas. Penso que vale a pena relembrar aqui os belos versos de Walt Whitman:

“Vem, disse minha Alma. Escrevamos tais versos para meu Corpo...Sempre com alegre sorriso eu possa prosseguir/ Sempre e sempre os versos possuindo – como antes e agora/ Assinando por Alma e Corpo, aponho-lhes meu nome

Walt Whitman/ Rubenio Marcelo

Enfim, como crítica literária abraço a literatura como meu modo de vida, mas a literatura que deve ser valorizada e vista “com muito sentimento, aprimorando o olhar a cada trabalho, a cada leitura até convertê-lo em conhecimento”. Harold Bloom

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