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Resgatados de carvoaria são indenizados por trabalho degradante

Gerente da fazenda contou ter presenciado situações envolvendo menores de idade na área da carvoaria

Quarta-feira, 06 Agosto de 2025 - 07:50 | Redação


Resgatados de carvoaria são indenizados por trabalho degradante
(Foto: Divulgação)

O resgate de dez trabalhadores submetidos a situação degradante de labor em uma carvoaria, na zona rural do município de Coxim, teve como resultado a assinatura de Termos de Ajuste de Conduta (TACs), firmados no último dia 24 junto ao Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso do Sul (MPT-MS).

Nesses acordos, o proprietário de uma empresa que recrutou as vítimas para realizar a limpeza de pasto na fazenda, em Coxim, comprometeu-se a indenizá-las pelos danos morais individuais provocados, cujos valores totalizam R$ 740 mil. 

As quantias foram calculadas conforme o valor-base salarial de cada trabalhador à época dos fatos.  Já a título de quitação das verbas rescisórias devidas aos resgatados, a planilha elaborada pela Fiscalização do Trabalho indicou valores entre R$ 2 mil e R$ 14 mil, definidos de acordo com o tempo de serviço prestado. A soma desse montante superou R$ 93 mil.

“Esta situação de trabalho escravo ocorreu em uma carvoaria, onde dez trabalhadores resgatados, sendo a maior parte deles traficados do estado de Minas Gerais, incluindo dois adolescentes, receberam o pagamento de dano moral individual na ordem de 50 vezes o salário, para os trabalhadores menores de idade, e de 20 vezes o salário para os trabalhadores adultos, como preconiza o artigo 223-G da CLT. Também houve a imposição de dano moral coletivo em razão dos prejuízos causados à sociedade, por conta dessa situação de submissão de trabalhadores à condição análoga à de escravo, combinada com o tráfico de pessoas”, esclareceu o procurador do Trabalho Paulo Douglas Almeida de Moraes.
 

 

Paulo Douglas conversa com uma das vítimas
Paulo Douglas conversa com uma das vítimas (Foto: Divulgação)
 
 
As vítimas foram identificadas durante inspeção conjunta do MPT-MS e Fiscalização do Trabalho, com apoio da Polícia Militar Ambiental e da Polícia do MPU, realizada no dia 22 de julho na propriedade rural que se destina à produção de carvão vegetal.

Em depoimento colhido durante as investigações, o gerente da fazenda contou ter presenciado situações envolvendo menores de idade na área da carvoaria, incluindo adolescentes em atividade laboral e uma criança sendo transportada na garupa de uma motocicleta. Ele disse ainda que não há fornecimento de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) aos empregados da carvoaria.

Entre os anos de 1995 e 2005, o segmento de carvoarias registrou expressiva incidência de casos de trabalho escravo, observando-se melhorias nas condições de labor até o flagrante destes trabalhadores. “Nós temos tido uma incidência maior de trabalho escravo contemporâneo no setor da pecuária, ligado a cercamento, mas agora também temos que ficar bastante atentos com o setor das carvoarias, que volta a apresentar sinais de recrudescimento do trabalho escravo no nosso estado”, alertou Moraes.

Reparação financeira às vítimas - A assinatura dos acordos ocorreu nas dependências da Vara do Trabalho de Coxim, após a localização e o deslocamento dos trabalhadores com apoio da Polícia Militar. Eles se encontravam em uma casa locada pelo empresário no município de Camapuã. Na ocasião, foram quitadas as verbas rescisórias devidas às vítimas, sob acompanhamento do procurador Paulo Douglas Moraes e supervisão dos auditores-fiscais que atuaram no caso.

O empresário também assumiu a responsabilidade de providenciar a documentação rescisória e efetuar o registro retroativo de todos os trabalhadores, bem como assegurar o pagamento pelos danos morais individual e coletivo decorrentes das irregularidades constatadas. Já o proprietário da fazenda assumiu o compromisso de figurar enquanto responsável subsidiário pelo cumprimento das obrigações de fazer e não fazer, exceto do registro retroativo.

O acordo ainda determina o recolhimento integral do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), referente aos períodos retroativos de vínculo, bem como da multa adicional de 40% sobre o saldo fundiário de cada trabalhador. O proprietário da empresa terá um prazo de até 120 dias para consolidar esses recolhimentos por meio do aplicativo FGTS Digital, devendo comprovar o cumprimento das obrigações no procedimento instaurado pelo MPT-MS.

Condições dignas de labor - Além das reparações financeiras às vítimas e à sociedade, o empresário pactuou um conjunto amplo de 20 obrigações de fazer e de não fazer, que tem como objetivo erradicar práticas abusivas de trabalho. O acordo vincula todas as empresas pertencentes ao grupo econômico do empregador.

Entre os compromissos ajustados no último dia 24, destacam-se: não admitir nem manter empregado sem registro em livro, ficha ou sistema eletrônico competente; garantir o fornecimento gratuito de EPIs aos trabalhadores rurais; deixar de contratar trabalhadores oriundos de outras regiões do Brasil ou do exterior, sem que seja garantido aos trabalhadores a gratuidade do transporte de ida e retorno do local de origem até o local da prestação dos serviços; proibição de agenciar, aliciar, recrutar, transportar, transferir, comprar, alojar ou acolher trabalhador mediante grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso, com a finalidade de submetê-lo a condições degradantes de labor; não manter trabalhador com idade inferior a 18 anos em atividades insalubres ou perigosas; disponibilizar áreas de vivência compostas de instalações sanitárias, locais para refeição e dormitórios compatíveis com a legislação trabalhista; promover treinamento para operadores de máquinas e equipamentos; abster-se de manter empregado submetido a regime de trabalho forçado e/ou reduzido à condição análoga à de escravo, além de outras obrigações.

Compensação pelos danos - O descumprimento de qualquer cláusula do acordo acarretará multa de 100% sobre o saldo devido, além de sanções que podem chegar a R$ 10 mil por infração cometida, valor este dobrado em caso de mortes ou lesões graves relacionadas às condições de trabalho. Os recursos das penalidades aplicadas, segundo o acordo, serão revertidos a campanhas educativas ligadas à área trabalhista ou destinados a entidade pública ou privada sem fins lucrativos.

O documento também prevê que o pagamento das multas não isenta o empregador do cumprimento das obrigações principais.

Denuncie - Todo cidadão que presenciar pessoas atuando de formas que caracterizem o trabalho análogo ao de escravo pode denunciar ao MPT. As denúncias devem ser feitas das seguintes formas:

Pelo site do MPT-MS www.prt24.mpt.mp.br/servicos/denuncias

Pelo aplicativo MPT Pardal, cujo download é gratuito para smartphones

Pelo portal da Inspeção do Trabalho https://ipe.sit.trabalho.gov.br/#!/

Ou pessoalmente em uma das três unidades do MPT-MS, localizadas em Campo Grande, Três e Lagoas e Dourados, de segunda a sexta-feira, das 9 às 17 horas (acesse os endereços aqui).

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